29 de setembro de 2012


Tão triste e tão só era a menina de olhos grandes. Passava horas e horas ao sereno, querendo pegar na brisa um vento de aconchego. Quando a noite chegava, ela se dirigia pra seu melhor lugar no mundo, a goiabeira do quintal. Era lá que as melhores conversas aconteciam e também as piores lágrimas. Sempre pensava que a qualquer momento alguém escutaria seus sussurros ou seus suspiros e quando não se controlava no choro, colocava a mão na boca até se conter. Nem sabia por que chorava, a única coisa que lhe via a cabeça era a dor de coração, na verdade era apenas uma dor no peito que parecia sugar todo seu ar. Desde que deu pra entender das coisas da vida ela começou a ter esses pantinhos, como dizia sua vó, mas não era porque ela queria, era porque acontecia.  Sua mãe bem que saberia dizer o remédio certo pra curar esse mal ou no mínimo, fazia-lhe um carinho até o sono engolir a dor. E ela desejava tanto ter sentido pelo menos uma única vez os dedos macios de sua mãe lhe acariciando a cabeça, o rosto, os braços. Então olhava pra suas mãos e imaginava que seus dedos finos e cumpridos seriam iguais ao de Dona Elena; mas só os dedos mesmo porque com certeza, sua mãe não teria na palma das mãos pele tão áspera e cortes incicatrizáveis. E quando estava assim, pensando no ser maternal, de alguma forma a dor de coração parecia dar uma trégua, mas era só aquele instantinho. Não tinha uma só noite que a dor não viesse. Não tinha uma noite que ela não chorasse, que ela não tapasse a boca, que ela não pensasse na mãe, que ela não quisesse sair por ai quando todos de casa estivessem dormindo. Queria ir atrás daquele Cristo que sempre aparece na televisão e pra lhe pedir uns conselhos, que ele lhe desse um rumo na vida. Era o único capaz de fazer isso, pois segundo ela, Cristo era alguém que não tinha pecados e como sempre ele estava ali sem sair do alto daquela pedra, não haveria como não encontra-lo. Embora sentisse essa vontade sabia que precisava crescer, só mais um pouco, crescer como suas irmãs: saber se maquiar, ter peitos e pernas pra os homens passarem a mão e pagar pra elas passearem com eles. Só não gostava muito da ideia de homens passando a mão pelo seu corpo, isso parecia muito com a brincadeira que seu pai gostava de brincar com ela. Mas a parte de ganhar dinheiro só pra passear era muito agradável. Então suspirava pacientemente e imaginava como seria quando tivesse dinheiro e pudesse sair dali pra nunca mais ouvir gritos da sua vó, nem brincar com seu pai e deixar de arrumar a casa bem cedinho antes de ir pra escola. Esse instante de sonhos era libertador: ela dava um abraço bem apertado e demorado na goiabeira. Tinha vontade de ir dormir logo pra o tempo passar depressa e ela crescer. Ai ela descia no pulo e saia correndo. E antes mesmo que subisse o último degrau pra entrar em casa, olhava pra trás e acenava com a mão como se dissesse “até amanhã”.

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