25 de fevereiro de 2014

Fragmento de "Papoulas ruivas" (o meio)



Ela a desejou naquele instante como quem precisa de ar num desligar do fôlego.
Enquanto conversavam, tentava desviar o olhar da boca que mexia seduzidamente aos movimentos das palavras e das coxas que sobressaiam à curvatura das pernas e ao molejo do vestido solto, que tinha a função de esconder algo que ela queria ver.
Quantos suspiros dados em meio a falta de ar. As mãos a todo tempo sobre as pernas, numa constante luta contra o suor que minava dos poros todos, concentrando-se apenas ali. Por pouco tempo Mariana conseguiu disfarçar seu desconforto e antes de ser constrangida por qualquer preocupação invasiva, pediu licença e foi até o banheiro. Olhou-se no espelho e viu a vermelhidão de seu rosto tenso e levemente suado. Molhou as mãos e esfregou-as na nuca, no rosto todo e nos braços. Respirando fundo ou se esforçando para manter o controle, ridicularizou-se diante de sua situação. Disse mentalmente que não tinha motivos para aquela situação toda. Era obvio que não se sentia bem e confundiu seu mal-estar junto à beleza de Diana.
Após um bom tempo presa em silêncio no banheiro, Mariana abriu a porta determinada. Diana se aproximou e parada a sua frente não lhe disse uma só palavra, mas seus olhos estavam tão fortemente fixados aos de Mariana, que esta se sentiu envadidamente desmascarada. Mariana procurou outro ponto que não fosse aqueles olhos para se refugiar. Achou o chão e dali mesmo de olhos baixos, disse à Diana que precisava ir porque já era hora próxima de seu marido chegar e ela ainda não havia decidido o que fazer para o jantar. Foi rapidamente de encontro à porta, quando foi surpreendida pelo forte aperto da mão direita de Diana no seu antebraço. Por milésimos de segundos conseguiu pensar que se virasse seria o fim de toda sua armadura, que tudo desmoronaria e se reconstruiria numa ferocidade incontrolável. Não teve muito tempo, a mão que lhe puxara tinha sido decidida e certeira demais, assim como o olhar de minutos atrás. Foi arrebatada com um calor escaldante daquela boca doce e suculenta, que lhe beijou não só a carne, mas a alma – entregue aquela paixão inevitável.
Não havia tempo para respirar, era sede demais para duas criaturas que por muito tempo evitaram o contato com a água. Agora o suor era constante, perante mãos que procuravam partes do corpo uma da outra, como se numa busca do paraíso. E se não fossem as paredes sólidas e bem postas daquela sala, elas haviam flutuado, tinha ido de mundo a fora sem noção do que era céu e terra, do que era chão e ar.
Suspiros e gemidos impediam o reinado do silêncio. As bocas não estavam mais unidas, mas outras partes haviam se encontrado naquela frenética obsessão de desejo, de querer como nunca se quis antes. Por um instante de sanidade, Diana foi guiando Mariana naquela dança de dois corpos quase nus, que bailavam em direção ao quarto sem nem sentir o que estava abaixo dos pés. Caíram estupidamente sobre a cama e era difícil se controlar uma sobre a outra, até que Mariana foi mais rápida e segurou os pulsos de Diana, impedindo-lhe sequer de se virar. E mesmo com pouco ar lhe restando, Diana foi tomada por palavras que mais pareciam notas bem harmônicas aos ouvidos de Mariana: “eu te quero como nunca quis ninguém!”. E isso foi o suficiente por todo o prazer que viera, na verdade, se nada tivesse sido dito o prazer existiria supremo e onipresente. Mariana queria concretizar o seu estado de plenitude, por isso tocava, beijava, mordia, lambia, chupava aquela outra mulher, que se contorcia em prazer. E Mariana nunc a foi assim: ousada. Era do tipo passiva, mas ali lhe viera algo descontrolado, impulsionando-lhe toda, fazendo de suas ações únicas, insubstituíveis. Parecia que ela sempre foi assim, que sempre soube o que fazer: ia direto onde a mão, a boca, os dedos queriam ir. Tirou a calcinha, última peça que lhe restava ao corpo e foi surpreendida pelo corpo que se jogava sobre o seu. Sentiu como se algo fosse lhe rasgar a alma quando um de seus seios foi engolido, de tanta suavidade. Uma suavidade tão precisa e delicada, que lhe arrepiou inteira ao sentir o passeio que a boa lhe fazia ao ventre. Seus dedos se apertavam e se enrolavam aos lençóis, na tentativa de transferir aquela carga explosiva que necessitava sair, antes que ela não resistisse e morresse por instantes. Mas foi irresistível não gritar ao sentir a suavidade encontrando-lhe a intimidade, tão impetuosamente gostoso. Seu corpo reagiu como pôde, em todas as vertentes, porém, foi o líquido que resumiu a grande verdade que se passara. Mariana gozou, gozou como bicho fêmea, como toda a força que a natureza propôs aos animais.
Ainda sem voltar totalmente ao estado normal, Mariana foi de encontro à Diana que estava deitada sobre suas pernas e tocou-lhe o cabelos e a face. Mariana não tinha muita força quando Diana deitou seu corpo calmo e quente sobre o dela, beijando-lhe lentamente em volta da boca. Fixou seu olhar intenso e risonho sobre os de Mariana, que não entendia porque eles tinham tanto poder sobre ela. Mariana também sentiu uma forte vontade de lhe tocar a face e de lhe beijar.  Assim o fez. Numa das pausas para retomar o fôlego foi forte o estado epifânico: deu-se conta de onde estava e do que havia acontecido. Pulou da cama, lançando Diana ao lado e procurou suas peças de roupa. Nessa busca enlouquecida, ia ficando cada vez mais desesperada, sentiu até vontade de chorar. Seu marido já devia estar em casa e preocupado. Que loucura, como poderia ter se deixado levar assim, pensou. Foi encontrando uma a uma de suas roupas por todo o trajeto que haviam percorrido e ia se vestindo. Diana não pensou em fazer e nem dizer nada, só a observava e angustiava-se. Ajeitou-se sobre a cama de modo que sua cabeça ficasse sobre o travesseiro de cara para o teto, tentando entender se aquilo tudo tinha acontecido, quando ouviu a porta se abrindo e os paços de Mariana saindo, apreçada demais para fechar a porta. Num estalo, deu-se conta que tinha ido embora a mulher mais incrível que já havia conhecido e sem muito pensar tentou encontrar as roupas que também estavam jogadas pela casa, mas se decidiu pelos lençóis e se enrolou neles. Correu em direção à saída, chamou duas vezes por Mariana enquanto corria e ao chegar ao corredor, viu que o elevador estava descendo e que Mariana nunca mais ia querer vê-la novamente.


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